Foi numa tarde, lembro muito bem, quase final de Verão quando a vi pela primeira vez, meus olhos brilharam e o meu coração acelerou, linda a segui com olhos atentos descendo a rua e, quando por mim passou, desafiou o vigor dos meus 21 anos.
Que sorte a minha, entrou no edifício, na mesma empresa na qual eu trabalhava. Acreditei na minha sorte mais uma vez quando soube que seria mais uma colega de trabalho. Mas a moça o que tinha de formosura tinha também de linha dura.
Os dias passando numa rapidez desenfreada desde aquele início de fevereiro, eu ainda prudente, pouco avançara. Outras estações passaram, mais um Verão por vir. Sentia-me tal quais as folhas no Outono soltas, a vagar pelas ruas.
O natal chegando, um presente o meu coração pedia. Na certa sabia que nutria por ela uma paixão secreta. Secreta então foi a chave da questão. Eu seria o falso amigo secreto na brincadeira de então. Rotineiramente depositava os meus bilhetinhos na caixinha e bem sei que todos ela recebia, pois, respostas vinham em profusão, um tanto de ingenuidade nas mensagens, outro tanto de emoção. Simples papeizinhos com recadinhos singelos proporcionaram por algum tempo um envolvente elo.
Na noite da entrega dos embrulhos secretos, na festa de confraternização, os presentes foram trocados e os amigos revelados. Ela não me tirara, eu tampouco ela. Pensei então em enfrentar o perigo, criei coragem e revelei que fora eu o falso amigo. Com um lindo e envolvente sorriso ela confessou, bem que desconfiava, tinha plena certeza de quem fora o autor de tal proeza. Daí para um convite para sairmos foi muito suave. Cinema amanhã, um lanche quem sabe ou um simples passeio pela cidade.
Era 21 de dezembro (de 1977) início da estação, primeira noite daquele Verão, não de um Verão qualquer como o tempo provaria. Uma chuvinha teimosa a cair sobre as ruas paulistana, e só ela precavida portava a sombrinha agora comigo. Oportunidade para caminharmos juntinhos na calçada, segurando o braço dela, driblando as poças d’água e protegidos por uma umbrela. Um sanduiche partilhado, um suco, um copo e dois canudos, um beijo ainda tímido e moderado foi o começo de tudo. Um filminho para descontrair sem ousadia para evitar um bofete, em cartaz no Cine Gazeta, da Avenida Paulista, uma película emblemática, “Aeroporto 77”.
Não recordo o que assisti se é que vi. Também nada sei do avião, se caiu ou em qual destino aportou, a única certeza é que o meu coração desde então decolou, continua a viajar, já são 47 Verões e até hoje não pousou.
Samuel De Leonardo (Tute) é publicitário. Atuou em diversas agências de Publicidade de São Paulo. Publicou os livros: “Hacasos” em 2016 e “Versos & Prosas” em 2022. Tem alguns de seus textos inseridos nos sites Recanto das Letras, Casa dos Poetas e das Poesias, e textos radiofonizados na voz do âncora Milton Jung, no programete Conte a sua história de São Paulo da Rádio CBN SP. samuel.leo@hotmail.com.br e Facebook@samueldeleonardo.