Fulano Brasileiro, sujeitinho mal tratado, quatro crianças pequenas para criar, mais a mulher prenha outra a esperar. Mora bem pra lá do fim do mundo. Acorda cedo, beberica uma miserável caneca de café puro, nem um pãozinho pra fome saciar.
Da vida faz o que pode, não reclama, só lamenta um destino melhor. Hoje está contente, se sentindo um cidadão de verdade. A firma onde trabalha, vai lhe dar um cartão do banco para receber o ordenado, um salário mínimo, ou no mínimo um salário.
Segue firme na labuta, com coragem e determinação. Na hora do almoço, arroz, feijão, quando não tem ovo tem a sardinha ou macarrão, assim todo dia é a sua marmita. Engole mais que depressa, tem ainda que passar na farmácia para fiar o remédio da mulher que o homem do rádio anunciou e ainda ir ao banco para sacar com o cartão que acabara de receber.
— Olhe seu Fulano — homem dos recursos humanos passando as instruções — preste muito atenção, não se esqueça de a senha digitar. São quatro números e mais duas letras para decorar, depois é só apertar o botão verde, é mais fácil do que votar.
Segue então pensativo e na sua imensa sabedoria fala consigo mesmo — é melhor do que votar, eu aperto e sai dinheiro, uai, quando voto só merda sai.
No banco, uma fila que só vendo. Quando chega a sua vez percebe que o papelzinho onde tinha anotado a senha com ele não está. Vai pela memória, digita uma vez e nada, digita outra vez, qual o quê. Pela terceira, a caixa engole o cartão. Desolado chama o funcionário que não lhe dá a mínima atenção. Desespera-se — e agora, não posso ir pra casa sem o dinheiro. Num gesto insano esmurra, soca, chuta o painel, em vão. Apanha um pedaço de madeira e desce a lenha naquela chocadeira. Para o seu azar o alarme dispara e de imediato é enquadrado por dois policiais.
No distrito tenta se explicar, mas o delegado não dá chance para ele falar e vai logo gritando — Vagabundo bandido ladrão, comigo não — Pede ao escrivão: — põem pra tocar piano. Mete todos os dedos na almofada e inclui suas digitais na ficha policial. O Pobre coitado não consegue argumentos convincentes. Sem piedade a autoridade manda enjaular o miserável que entre feras se pega a chorar.
Divide a cela com mais dez elementos. Só ó Cidão Brucutu, por incrível que pareça se comove com aquela situação — fica assim não mano, a gente logo se “costuma”.
— Porque você tá aqui? — pergunta Fulano Brasileiro.
— Eu? Eu assaltei bancos pra caramba, e você?
— Acredite se quiser — responde Fulano — um caramba de banco me assaltou.
Samuel De Leonardo (Tute) é publicitário. Atuou em diversas agências de Publicidade de São Paulo. Publicou os livros: “Hacasos” em 2016 e “Versos & Prosas” em 2022. Tem alguns de seus textos inseridos nos sites Recanto das Letras, Casa dos Poetas e das Poesias, e textos radiofonizados na voz do âncora Milton Jung, no programete Conte a sua história de São Paulo da Rádio CBN SP. samuel.leo@hotmail.com.br e Facebook@samueldeleonardo.