O futebol amador paulista ganha protagonismo no Museu do Futebol com a exposição Vozes da Várzea. Plural, democrática e atemporal, a prática esportiva iniciada às margens dos rios que cortam a cidade de São Paulo é apresentada por meio de imagens, textos, mapas, instalações audiovisuais e objetos.
Mais do que um esporte ou uma brincadeira, o futebol de várzea movimenta o território no qual está inserido. Incide nas economias locais, conecta-se à cultura, por meio de campeonatos, festas populares, escolas e rodas de samba, assim como desperta o espírito de pertencimento na população. Torcidas não faltam numa várzea diversa, plural, praticada em grande escala e espelha as próprias dinâmicas de sociabilidade e resistência na cidade.
Com curadoria de Alberto Luiz dos Santos e Diego Viñas, a exposição é dividida em sessões temáticas: Campos e Resistências; Lembrar é Resistir; Economia da Várzea; Chega pra Somar; Culturas em Campo. Assim, Vozes da Várzea aborda diversos aspectos como uma viagem no tempo por São Paulo, pela história e resistência desse futebol que mantém viva a magia comunitária.
Lugares e memórias: em Campos e Resistências, o visitante acompanha a relação entre o crescimento de São Paulo e o futebol amador. Os primeiros registros da prática são da região da Várzea do Carmo, às margens do rio Tamanduateí. Com o avanço das construções, os terrenos utilizados ficaram cada vez mais escassos, empurrando a várzea para as áreas periféricas do município. Ao longo dessa trajetória, não faltou resistência. Criado em 1930, o Campo de Marte ainda abriga o campo de seis agremiações, após muita luta para evitar a extinção do espaço.
A seção Lembrar é Resistir trata de personagens, times e campeonatos lendários da várzea paulista – Francisco Ingegnere, mais conhecido como Chiquinho, é um exemplo. Sua trajetória está totalmente atrelada ao Santa Marina Athlético Clube, agremiação fundada em 1913 no bairro da Água Branca. A Copa Kaiser é outro destaque: transformou-se no principal torneio amador da cidade em 1995 e, em 2009, chegou a ter duas séries com a presença de 400 times.
O futebol de várzea também movimenta a economia. Embora longe das cifras bilionárias da prática profissional, confere renda ao comércio local, às pessoas envolvidas na organização dos campeonatos, aos que produzem flâmulas e camisas, além de remuneração para os jogadores – dependendo das condições do time e do nível técnico do atleta amador. A exposição mostra como até contas de luz e cestas básicas já foram oferecidas como forma de contar com os atletas em campo.
Cultura e comunidade: na seção Chega pra Somar, o público confere os bastidores da várzea – o que mantém as sedes, os campos, os materiais usados durante as partidas; como a população local se envolve para realizar eventos comemorativos e contribuir com o seu clube do coração. Famílias inteiras se dedicam a essas tarefas, formando mais do que torcidas, redes de apoio aos times. Além disso, em alguns casos, surgem projetos sociais visando à formação de novos atletas e a promoção de lazer comunitário.
Na várzea, é nítida a conexão com a cultura local. O funk, o samba, o churrasquinho no começo ou fim da partida estão no entorno do futebol amador. Sem contar as torcidas, que criam músicas para embalar o time dentro e fora de campo.
Objetos varzeanos: além dos painéis de fotos e textos, diversos objetos são expostos durante a mostra. Entre eles, apitos, camisas de times, medalhas, taças de competições conhecidas como a Super Copa Pioneer e até uma autêntica churrasqueira, dessas que ficam à beira do campo. Uma instalação especial reunirá dezenas de camisas de várzea de acervos dos curadores, de personalidades da várzea entrevistadas para a exposição e da coleção do Bom Dia São Paulo, programa jornalístico da TV Globo que mostra semanalmente, ao vivo, as camisas enviadas pelos times.
O Museu do Futebol tem mais de 500 registros relacionados ao futebol de várzea em São Paulo, incluindo times, pessoas, acervos e eventos. Material que permite compreender as transformações pelas quais a prática amadora passou ao longo dos anos. No passado, o Desafio do Galo – uma das mais famosas competições – chegou a ser televisionado. Na atualidade o torneio das Favelas ocupa este espaço. Os famosos terrões estão dando lugar aos gramados sintéticos, mas a dedicação e o envolvimento das comunidades em torno do futebol de várzea persistem ao tempo.
Vozes da Várzea, no Museu do Futebol
Até 27 de abril de 2025. Terça a domingo, das 9h às 18h.
Praça Charles Miller, s/nº. Estádio Paulo Machado de Carvalho – Pacaembu
Fonte: museudofutebol.org.br